fbpx

Lei De Liberdade Econômica – Análise à luz da Perícia

1 – Da Lei de Liberdade Econômica

O Presidente da República Jair Bolsonaro promulgou a Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019, apelidada como Lei de Liberdade Econômica.

Alguns pontos desta lei merecem destaque:

Art. 2º  São princípios que norteiam o disposto nesta Lei:

(…)

III – a intervenção subsidiária e excepcional do Estado sobre o exercício de atividades econômicas; e

Art. 3º  São direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País, observado o disposto no parágrafo único do art. 170 da Constituição Federal:

II – desenvolver atividade econômica em qualquer horário ou dia da semana, inclusive feriados, sem que para isso esteja sujeita a cobranças ou encargos adicionais, observadas (…)

(…)

V – gozar de presunção de boa-fé nos atos praticados no exercício da atividade econômica, para os quais as dúvidas de interpretação do direito civil, empresarial, econômico e urbanístico serão resolvidas de forma a preservar a autonomia privada, exceto se houver expressa disposição legal em contrário;

2 – Da Desconsideração da Personalidade  Jurídica

O direito brasileiro protege (protegia) a sociedade da atuação maliciosa de empresas.

No Brasil, uma empresa pode ser constituída de várias formas. A mais comum delas é a Sociedade Limitada, o que significa que o patrimônio do sócio só pode ser agredido para saldar dívidas da empresa até o limite das suas cotas de propriedade daquela empresa.

O problema começa quando essa proteção natural é utilizada com má-fé, que é o caso em que a empresa é criada especialmente para dar “calotes” no mercado.

Se os sócios maldosamente operam “caixa 2” e escondem os recursos visíveis da empresa através de laranjas, a empresa fica sem ter como saldar sua dívidas no mercado, enquanto os sócios enriqueceram ilicitamente.

Para resolver isso, a lei brasileira possui o instituto da “Desconsideração da Personalidade Jurídica da empresa“, que é um procedimento próprio destinado a afastar a limitação (principalmente da sociedade limitada), de modo que o juiz possa agredir o patrimônio da pessoa do sócio da empresa para saldar dívidas que são da empresa e não da pessoa do sócio.

3 – Do Código Civil Brasileiro após a Lei De Liberdade Econômica

3.1 – Do artigo 50 do Código Civil Brasileiro

O art. 7º dessa Lei de Liberdade Econômica promoveu as seguintes alterações no Código Civil Brasileiro:

Art. 50.  Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.

(…)

§ 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por: 

I – cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa;

II – transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e

III – outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.

§ 3º  O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica.

Na prática, os parágrafos 2º e 3º do art. 50 do Código Civil Brasileiro passaram a exigir maior dificuldade para a despersonalização da personalidade jurídica de uma empresa especialmente criada para lesar os consumidores e dar calotes (e demais golpes) na sociedade.

Continuando no artigo 50 do Código Civil Brasileiro, agora com a alteração feita pela Lei de Liberdade Econômica:

§ 4º  A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica.

Esse parágrafo 4º protege exageradamente o grupo econômico de sofrer os rigores de uma condenação judicial, ou seja, determinando a certeza da impunidade para a empresa criada especialmente para lesar a sociedade e o consumidor.

Também foi alterado o Parágrafo 2º do art. 113 do Código Civil, com a nova redação “as partes poderão livremente pactuar regras de interpretação, de preenchimento de lacunas e de integração dos negócios jurídicos diversas daquelas previstas em lei”.

Deste modo, a nova Lei de Liberdade Econômica assegura à empresa mais forte uma capacidade maior ainda de força em conflito contra a empresa mais fraca, de modo a sepultar (mediante esta lei a qual entendemos inconstitucional) os próprios princípios supremos da Razoabilidade e da Proporcionalidade insculpidos na Constituição.

Em larga escala, entendemos que esta Lei de Liberdade Econômica foi criada especialmente para promover o enriquecimento dos mais ricos e o empobrecimento da classe média, que passará então a integrar a categoria dos verdadeiramente pobres.

3.1 – Do artigo 421 do Código Civil Brasileiro

Em prejuízo da boa-fé dos contratos, esta Lei de Liberdade Econômica foi além.

Idêntica alteração legislativa ocorreu no artigo 421, destinando-se à mesma manobra legislativa antissocial.

Parágrafo único. Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual.

Ou seja, todo contrato, por mais absurdo e desproporcional que seja, agora é presumido como válido. Pense nos contratos de adesão em que uma mega empresa “obriga” a outra (microempreendedor individual) a assinar, senão não tem negócio. É a vitória incontestável do mais forte sobre o mais fraco.

Já na alteração promovida no art. 421-A do do Código Civil, este passou a ter a seguinte redação:

Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção (…)

Novamente, pense em um conflito entre uma mega empresa e um microempreendedor individual (MEI), em que o contrato é manifestamente leonino e abusivo.

Porém, agora com a Lei de Liberdade Econômica, este mesmo contrato não é mais abusivo aos olhos da legislação brasileira.

Neste ponto, é de se notar que esta Lei de Liberdade Econômica está equiparando as forças (econômica, financeira, informacional, técnica etc.) entre o micro empresário e um conglomerado multinacional, como se não existisse ali uma parte mais fraca e outra muito mais forte.

Importante apontar que isso não se limita ao âmbito empresarial, onde estão presentes os empreendedores brasileiros. Essa alteração também atinge boa parte dos negócios jurídicos entre empresas e pessoas físicas, em todas as modalidades de contrato que não se enquadram como as protegidas pelo Direito do Consumidor, que são várias.

Como exemplo de contratos de pessoa x empresa que não são regidas pelo Código de Defesa do Consumidor , tem-se Compra e Venda, do Contrato Estimatório, da Locação, do Comodato, da Prestação de Serviço, dentre outros.

4 – Das intenções escondidas do Ministro da Economia e do Poder Legislativo com a Lei De Liberdade Econômica

Ao ponto de vista técnico, obviamente a Lei de Liberdade Econômica tratou-se de uma manobra política destinada a diminuir o número de processos judiciais ajuizados em face das empresas mais processadas do Brasil.

Como o Conselho Nacional de Justiça monitora a Justiça em números, essa queda no número de processos não quer dizer que as piores empresas do Brasil deixaram de somar processos na Justiça porque melhoraram a qualidade da prestação de seus serviços.

Muito pelo contrário, agora sim a porteira foi aberta para que as más empresas possam, tranquilamente, piorar ainda mais a qualidade da prestação de seus serviços, já pessimamente prestados.

É a maximização do lucro a qualquer preço. Está muito enganado quem pensa que nos Estados Unidos (o país da “liberdade econômica“) seja assim.

Lá nos Estados Unidos a Lei funciona para punir pesadamente o mal prestador de serviço. Aqui no Brasil o Ministro da Economia se empenha em alterar a Legislação brasileira para imunizar a empresa criada especialmente para dar golpes no mercado.

Assim, a Lei de Liberdade Econômica é uma manobra legislativa maldosa, de iludir os acionistas externos das grandes corporações em falar que a prestação de serviços no Brasil melhorou e que o Brasil está ficando mais confiável para investimentos; o que eu e você sabemos que passa longe de ser uma verdade.

No futuro próximo, o choque será muito maior, pois os investidores internacionais conhecerão a verdade que os enganou e, enquanto isso, a sociedade brasileira empobrece drasticamente, principalmente o pequeno empreendedor.

Entretanto, isso foi feito de forma a blindar essas péssimas empresas no mercado, dando-lhes carta branca para continuarem prestando péssimos serviços e garantindo-lhes a tão sonhada impunidade perante a lei brasileira.

Ainda, é de se ressaltar que esta norma também abre espaço para que novas empresas sejam criadas com o objetivo único de praticar ilícitos sem sofrerem qualquer represália do Judiciário; e quem paga a conta é a sociedade, sempre.

Desta forma, em análise estritamente técnica e sem qualquer juízo de valor ou inclinação política sobre “direita” ou “esquerda”, tem-se que a Política Econômica das alterações legislativas promovidas pelo atual Governo Federal tende a abolir a classe média, bem como os pequenos e médios empresários, tendo como consequência direta o enriquecimento exponencial de uma parcela mínima da população.

5 – Do Código de Defesa do Consumidor – Lei 8.078/90 – em relação à Lei De Liberdade Econômica

Entretanto, apesar de a Lei de Liberdade Econômica criar grande retrocesso na credibilidade internacional da economia brasileira em relação aos cenários de exportação e de comércio exterior, essas alterações legislativas não possuem (pelo menos ainda!) robustez suficiente para atingirem os contratos protegidos pelo Código de Defesa do Consumidor.

O Código de Defesa do Consumidor é uma Lei própria e específica, de forma a ainda dar alguma garantia ao Consumidor e alguma segurança jurídica para o país.

Esta mesma sorte já não teve o pequeno empresário, que se restou abocanhado pelo “sistema”, destinado a sofrer os efeitos deletérios ainda no curto prazo.

Vejamos a posição em que se encontrou o pequeno empresário no Brasil:

De um lado, a nova Lei de Liberdade Econômica esfola o pequeno empresário.

De outro lado, o Código de Defesa do Consumidor não permite que a empresa consiga descontar no consumidor os malefícios que a Lei de Liberdade Econômica o causou.

A “Lei de Liberdade Econômica” recebeu esse nome sofisticado e até mesmo romântico, voltado para fins de publicidade.

6 – Conclusão da Lei De Liberdade Econômica à luz da Perícia

Com esse belo nome, a “Lei de Liberdade Econômica” até aparenta ser algo positivo aos olhos do homem médio, leigo.

Que Deus ajude o pequeno e o médio empresário a partir de agora, que são os grandes atingidos por essa bomba federal!

Aos olhos do Consumidor, podemos esperar do Ministro da Economia projetos de alteração de “flexibilização” do Código de Defesa do Consumidor, o que não foi objeto da Lei de Liberdade Econômica, já que isso iria causar muito desgaste político, o que poderia prejudicar sua aprovação no Congresso Nacional.

Afinal, se alguém tiver que pagar a conta, na cabeça do Ministro da Economia, que seja o pobre e não o pequeno empresário…apesar de que o pequeno empresário não dá lucro pro governo, pois também sonega muitos impostos…

Aos olhos da perícia judicial, é de se considerar que diminuirá substancialmente a quantidade de processos judiciais que visem revisão de contratos abusivos.

Entretanto, essa diminuição está limitada aos contratos não abrangidos pelo Código de Defesa do Consumidor, que são a grande maioria dos processos judiciais.

Nos contratos em que o Código de Defesa do Consumidor é aplicável, por enquanto nada muda à luz da Perícia (repito: por enquanto).

Curso de Perícia Financeira Forense

Compartilhe:

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on email
Share on telegram
Share on whatsapp

Mais Artigos

Nos envie uma mensagem